terça-feira, 7 de dezembro de 2021

A IMPORTÂNCIA DA LUDICIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL

O QUE É LUDICIDADE?

Fonte: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/implementacao/praticas/caderno-de-praticas/aprofundamentos/198-o-lugar-do-ludico-na-educacao-infantil

Por Fernanda Mendes


Durante muito tempo a criança foi vista como um estorvo para a sociedade, um ser incompleto que, considerado um miniadulto, deveria ter a infância apressada. Comumente, a criança era silenciada ou imobilizada, subjugada pelo que Montessori afirma ser o “direito do adulto”:

Quando a criança se sentava nos móveis dos adultos, ou no chão, era repreendida; tornava-se necessário que alguém a pegasse no colo para que pudesse sentar. Eis a situação de uma criança que vive no ambiente dos adultos: um importuno, que procura algo para si e não encontra, que entra e logo é repudiado. Uma situação semelhante à de um homem privado de direitos civis e de ambiente próprio: um ser marginalizado pela sociedade, que todos podem tratar sem respeito, insultar e castigar, por força de um direito conferido pela natureza - o direito do adulto. (MONTESSORI, 1984, p. 7)

Desta forma, a ludicidade era tida como forma de entreter a criança, ou mesmo de recompensá-la por determinados comportamentos desejáveis. Hoje, no entanto, após muitos estudos, pesquisas e experiências educacionais diversas, sabemos que a ludicidade tem um papel determinante para o desenvolvimento da criança pequena. É por meio da brincadeira, do jogo e do brinquedo que ela se expressa, externaliza o que aprendeu, se manifesta, interagi e assim se desenvolve.

Quando uma criança imita um determinado papel social, como uma professora, por exemplo, ela está externalizando o que compreendeu sobre esta função, e isso é muito rico para ser explorado em seu desenvolvimento global. É preciso, porém, observar que a ludicidade na Educação Infantil deve ser apresentada à criança com uma intencionalidade pedagógica previamente determinada, pois:

Atirar qualquer brinquedo a qualquer criança pode agradar seu sentimento de posse, mas compreender a mente dessa criança e, com cuidado e critério, selecionar esse brinquedo, ensinando-a a brincar, é ir muito além, é, em verdade, educar. (ANTUNES, 2017, p.13)

De acordo com Carmo et al. (2017, p. 12.901)

O termo Ludicidade é utilizado e debatido por várias pessoas, em especial por professores pesquisadores da Educação Infantil. Segundo o dicionário Aurélio ludicidade significa: “qualidade do que é lúdico”. Ludicidade são atividades de caráter livre, para que uma brincadeira seja considerada lúdica ela deve ser de escolha da criança entre participar ou não dela. A ludicidade não se delimita apenas aos jogos, as brincadeiras e aos brinquedos, ela está relacionada a toda atividade livre e prazerosa, podendo ser realizada em grupo ou individual.

Assim, pode-se conceituar a ludicidade como uma forma de abranger as situações nas quais se usa a imaginação, a criatividade e a fantasia, por meio do uso da brincadeira, do jogo e do brinquedo. Deste modo, é fundamental conceituar cada uma destas três relevantes partes da ludicidade.

A brincadeira é uma atividade livre, que pode ocorrer com ou sem o uso de recursos ou brinquedos, que não possui regras e que pode ser realizada em grupo, em duplas ou de forma individual. A brincadeira depende somente da ação de quem brinca, podendo assim ser utilizada de modo muito peculiar pela criança.

O brincar é considerado umas das principias expressões do comportamento infantil, o brincar por intermédio de jogos e brincadeiras, faz a criança interagir com o seu ambiente material e emocional, compõe conhecimento, adota e gera cultura e também estabelece e certifica sua maneira própria de ser e estar no mundo. Sendo importante o brincar é tido como base central do trabalho pedagógico na educação infantil, pronunciando várias linguagens e experiências curriculares nessa primeira etapa da Educação. (PINATI et al. 2017, p. 59)

O jogo tem peculiaridades diferentes da brincadeira, pois depende do uso de regras. Para tanto, é preciso que a ação de jogar seja desenvolvida individualmente, por pares ou grupos, e que todos compreendam o objetivo e as regras. Henri Wallon (1879 – 1962) e Jean Piaget (1896 – 1980) estudaram profundamente a relação do jogo com o desenvolvimento infantil, observando que existem diferentes fases nas quais as crianças podem compreender os jogos.

Os jogos são importantes, pois a criança confirma as múltiplas experiências vivenciadas, como: memorização, enumeração, socialização, articulação sensoriais, entre outras. De acordo com as ideias de Wallon os jogos para criança têm papel de progressão funcional, já para o adulto tem papel de regressão, uma vez que, o homem quer se desligar o mais rápido das atividades lúdicas (deixar de ser criança), aproximando-se das atividades como o trabalho. É importante o papel de um adulto/educador presente em todas as fases desenvolvimento da criança, pois será capaz de intervir adequadamente no jogo infantil, estacando o progresso e possibilitando maior crescimento. Por conseguinte, o adulto deve ser um facilitador e não um jogador do jogo. (LUIZ et al., 2014)

Kishimoto (1977) descreve o brinquedo como sendo um objeto de profunda relação com a criança, que atribui significados únicos a ele, que pode ser utilizado de formas diversas, não sendo utilizado com base em nenhuma regra. Deste modo, a boneca pode ser para a criança a filha, a mãe, uma amiga, ou apenas um objeto a ser manipulado. Um carrinho pode ser um meio de transporte, mas também pode ser uma nave espacial, se assim a criança decidir. É a imaginação que faz com que o brinquedo ganhe vida e assim interaja com a criança. Os brinquedos não precisam necessariamente ser sofisticados, com tecnologias, luzes ou se movimentar sozinhos. Na realidade, uma criança é capaz de tornar uma caixa de sapatos um brinquedo, por meio do uso de sua imaginação. É preciso, no entanto, que o educador estimule a fantasia e a iniciativa da criança.

Ao compreendermos melhor a ludicidade, é preciso ainda pontuar que ela está definida como essencial também pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que apoiada em teorias construtivistas aponta “interações e brincadeiras” como eixo estruturante para as práticas pedagógicas envoltas nesta etapa educativa.

Considerando que, na Educação Infantil, as aprendizagens e o desenvolvimento das crianças têm como eixos estruturantes as interações e a brincadeira, assegurando-lhes os direitos de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se, a organização curricular da Educação Infantil na BNCC está estruturada em cinco campos de experiências, no âmbito dos quais são definidos os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento. Os campos de experiências constituem um arranjo curricular que acolhe as situações e as experiências concretas da vida cotidiana das crianças e seus saberes, entrelaçando-os aos conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural. (BRASIL, 2018)

Deste modo, as situações que envolvem a ludicidade devem sempre pautar as práticas pedagógicas do professor que atua nesta etapa educativa. A BNCC aponta ainda que o fazer pedagógico deve compreender cinco distintos campos de experiência, que são: O eu, o outro e o nós, Corpo, gestos e movimentos, Traços, sons, cores e formas, Escuta, fala, pensamento e imaginação e também Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações. Os campos de experiência são fundamentais para que a criança tenha seus conhecimentos prévios valorizados nas práxis pedagógicas diárias, e torna o processo de ensino e aprendizagem mais dinâmico, significativo e relacionado à realidade.

Por fim, pontuamos ainda que é necessário dar voz ao aluno, criando sempre oportunidades nas quais ele se torne protagonista de suas aprendizagens, por meio de ferramentas e situações que gerem engajamento. Assim, atualmente, muito tem sido debatido sobre o uso de metodologias ativas na educação, que são justamente o uso de ferramentas que levem o aluno ao centro do processo educativo. É possível assim permitir que a criança escolha brincadeiras ou jogos, que estipule como deve usar os brinquedos, e assim tornar a sala de aula um espaço educativo mais democrático e dinâmico.


REFERÊNCIAS


ANTUNES, Celso. O jogo e a educação infantil: falar e dizer, olhar e ver, escutar e ouvir. Petrópolis: Vozes, 2017.

BRASIL, Ministério da Educação (MEC). Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Brasília, 2018.

CARMO, Carliani Portela et al. A ludicidade na educação infantil: aprendizagem e desenvolvimento. XIII Congresso Nacional de Educação. EDUCERE. 2017. Disponível em: <https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2017/23662_12144.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2021.

KISHIMOTO, Tizuko Morchida et al. Jogo, brinquedo, brincadeira e educação. São Paulo: Cortez, 2000.

LUÍZ, Jessica Martins Marques et al. As concepções de jogos para Piaget, Wallon e Vygotski. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 19, Nº 195, agosto de 2014. Disponível em: <https://www.efdeportes.com/efd195/jogos-para-piaget-wallon-e-vygotski.htm>. Acesso em: 22 nov. 2021.

MONTESSORI, Maria. A criança. Tradução de Luiz Horácio da Matta. São Paulo: Círculo. 1984.

PINATI, Carolina Taciana et al. Os jogos e brincadeiras na educação infantil. Ciência et Praxis, v. 10, n. 19, p. 57-62, 2017. Disponível em: <https://revista.uemg.br/index.php/praxys/article/view/2658/1505>. Acesso em: 22 nov. 2021.

A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS


Fonte: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/
Por Fernanda Mendes

No ano de 2017 fora homologada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que surgiu com a intencionalidade de propiciar a garantia de qualidade e continuidade na Educação Básica de todo o país. Com isso, o documento apresenta uma parte comum e uma diversificada, que apresentam uma visão muito diferente do ensino desenvolvido com técnicas tradicionais, pois é voltado a levar o aluno a desenvolver competências e habilidades, que serão úteis em sua vida real. Deste modo, a BNCC apresenta um conjunto com 10 Competências Gerais que são: Conhecimento; Pensamento científico, crítico e criativo; Repertório cultural; Comunicação; Cultura digital; Trabalho e projeto de vida; Argumentação; Autoconhecimento e autocuidado; Empatia e cooperação; e Responsabilidade e cidadania (BRASIL, 2018). Entretanto, para compreender melhor a BNCC e as práticas pedagógicas que ela orienta, é fundamental fazer uma reflexão sobre as tendências pedagógicas brasileiras, e com isso, iremos apresentar o pensamento liberal e o progressista sobre o ensino, de acordo com cada uma das correntes que são compreendidas nestes contextos.

A tendência liberal, ou pedagogia liberal, percebe o ensino como uma forma de levar os sujeitos a desempenhar papéis sociais, portanto, não estimula que a educação sirva para transformação das pessoas, e sim para manutenção do status quo. Os sujeitos devem ser preparados para desenvolver de modo mais eficiente o que as gerações passadas já faziam. Ela apresenta quatro correntes distintas: tradicional, não-diretiva, progressiva e tecnicista.

[...] a pedagogia liberal sustenta a ideia de que a escola tem por função preparar os indivíduos para o desempenho de papéis sociais, de acordo com as aptidões individuais. Isso pressupõe que o indivíduo precisa adaptar-se aos valores e normas vigentes na sociedade de classe, através do desenvolvimento da cultura individual. Devido a essa ênfase no aspecto cultural, as diferenças entre as classes sociais não são consideradas, pois, embora a escola passe a difundir a ideia de igualdade de oportunidades, não leva em conta a desigualdade de condições. (SILVA, 2000)

A corrente tradicional é conceituada por sua intencionalidade de difundir o conhecimento a todos do modo igual, utilizando assim aulas expositivas e enciclopédicas. O professor é extremamente verborrágico, e assim, em sala de aula, é o detentor dos conhecimentos. O aluno é uma tábula rasa, que não tem suas experiências e conhecimentos prévios valorizados, afinal, são irrelevantes. O aluno aprende de modo mecânico, e assim memorizam e reproduzem os conhecimentos. De acordo com Paulo Freire (2021) essa pedagogia pode ser conceituada como educação bancária, e com isso deposita os conhecimentos na mente dos alunos que se tornam sujeitos expectadores do mundo, e não recriadores.

A não-diretividade surgiu com o movimento da Escola Nova, no início do século XX. Junto com este movimento, surge uma preocupação com o interesse do aluno, por meio do que ficou conhecido como não-diretividade, ou seja, um ensino que não direcione o aluno, antes, que permita que ele se desenvolva de modo mais natural, respeitando sempre seus conhecimentos prévios. No entanto, essa pedagogia acentuou as diferenças sociais entre as classes, pois enquanto a escola de classes abastadas possui espaços interativos e relevantes para que o aluno seja levado a aprender a aprender, na escola das periferias o cenário era bem diferente.

A corrente renovada progressiva coloca o foco do processo de ensino e aprendizagem no aluno, percebendo a relevância dos processos psicológicos e da afetividade. Para tanto, como o aluno aprende é mais importante do que o que o aluno aprende. O aprendizado não é mais imposto, e sim construído. Como não há críticas ao currículo tradicional, nem tão pouco um olhar sobre a relevância das diferenças entre as classes sociais, é ainda uma corrente liberal.

Por fim, apresenta-se a corrente tecnicista, que acreditava ser a escola um espaço importante para que o aluno seja formado para o mercado de trabalho. Deste modo, o ensino se fazia por meio do uso de cartilhas e manuais que induziam a um estudo mecanicista, onde disciplinas consideradas subversivas ou inúteis ao propósito eram excluídas. No Brasil, o tecnicismo teve seu auge durante a Ditadura Militar (1964 – 1985), excluindo assim disciplinas como sociologia e filosofia dos currículos brasileiros.

Tratava-se de opção explícita para que as possibilidades reflexivas e de análise da realidade e da vida política do país deixassem de existir e, em seu lugar, fossem estabelecidas disciplinas escolares voltadas muito mais à catequese e alienação dos estudantes, inseridas nos supostos valores morais, religiosos e de amor à pátria, contidos nas propostas das disciplinas de Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política Brasileira (OSPB). (COSTA; SUBTIL, 2016)

A tendência progressista tem uma visão educativa que compreende a escola como um espaço de construção social coletiva e individual, na qual o aluno aprende para transformar sua realidade. Portanto, a educação é uma ferramenta de transformação, na qual o aluno pode se pautar para modificar o meio em que ele vive. Esta tendência apresenta três distintas correntes, que são: libertadora, libertária e crítico-social dos conteúdos.

As tendências pedagógicas progressistas, em oposição direta ao capitalismo, postulam uma educação partindo de uma análise crítica e consciente das realidades sociais, defendendo um ensino que questione e transforme os modelos sociais pré-estabelecidos. (OLIVEIRA, 2017, p. 7)

A corrente libertadora tem como precursor Paulo Freire (1921 – 1997), crítico ferrenho ao liberalismo e ao ensino tradicional. Em sua maneira de conceber a pedagogia, Freire sinalizava a importância de promover um ensino que trouxesse ao sujeito a possibilidade de se livrar da opressão imposta pela sociedade capitalista e autoritária. Ele percebia a educação como uma forma de trazer libertação social, gerando autonomia e criticidade ao cidadão.

Não basta saber ler mecanicamente que “Eva viu a uva”. É necessário compreender qual é a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir uvas e quem lucra com este trabalho. Os defensores da neutralidade da alfabetização não mentem quando dizem que a clarificação da realidade simultaneamente com a alfabetização é um ato político. Falseiam, porém, quando negam o mesmo caráter político à ocultação que fazem da realidade. (FREIRE, 1996)

A corrente libertária é calcada no anarquismo, e tem como base a busca por um ensino no qual o aluno desenvolva autogestão e a autorregulação. Desta forma, a corrente libertária rejeita qualquer forma de autoridade imposta, e considera o professor um facilitador e conselheiro do aluno. Finalizamos as tendências progressistas com a corrente crítico-social dos conteúdos, que visa levar uma educação que forme o aluno para uma vida adulta autônoma. Deste modo, é premissa desta corrente relacionar os saberes com a vida real, de modo que o aluno atribua um sentido vivo sobre os conhecimentos que lhes são apresentados.

É possível assim perceber que a BNCC se distancia das tendências liberais, ao passo que se aproxima das progressistas, principalmente da corrente crítico-social dos conteúdos. Deste modo, ela busca levar o aluno a aprender os conteúdos para a vida real, por meio de metodologias ativas que realmente levem o aluno a se tornar o protagonista de seus processos educativos. Isso é muito notório quando abordamos as 10 Competências Gerais, que são estabelecidas para as práticas pedagógicas de toda a Educação Básica brasileira.


REFERÊNCIAS


BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Brasília, 2018.

COSTA, Regis Clemente da; SUBTIL, Maria José Dozza. A DITADURA MILITAR NO BRASIL E A PROIBIÇÃO DO ENSINO DE FILOSOFIA: ENTRE O TECNICISMO E A SUBVERSÃO POLÍTICA. Imagens da Educação, v. 6, n. 2, p. 29-41, 2016.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, São Paulo: Paz e Terra, 1996.

____________. Pedagogia do oprimido. 17ª Edição, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2021.

OLIVEIRA, Fernanda Moraes de. Tendências Pedagógicas Progressistas Brasileiras: Concepções e Práticas. MESTRADO EM ESTUDOS PROFISSIONAIS ESPECIALIZADOS EM EDUCAÇÃO: ESPECIALIZAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES EDUCATIVAS. ESE Politécnico do Porto. 2017. Disponível em: https://recipp.ipp.pt/bitstream/10400.22/10743/1/DM_FernandaOliveira_2017.pdf. Acesso em: 08 nov. 2021.

SILVA, Delcio Barros da. As principais tendências pedagógicas na prática escolar brasileira e seus pressupostos de aprendizagem. Linguagens & Cidadania, v. 2, n. 1, 2000.

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

PROJETO DE VIDA E A FORMAÇÃO INTEGRAL DOS SUJEITOS

Fonte: https://blog.nd.org.br/projeto-de-vida-e-escolha-profissional/
Por Fernanda Mendes

Homologada em dezembro de 2017, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) vem lançar uma perspectiva educativa que rompe com a fragmentação do ensino e principalmente com visões conteudistas e verborrágicas da educação. Desta forma, a premissa da BNCC é levar a educação à construção de uma formação integral do aluno, o colocando no centro de seus processos educativos. O protagonismo do aluno é a maior preocupação do documento que estabelece o desenvolvimento de competências e habilidades como maior relevância do ensino brasileiro.

A BNCC traz em seu texto 10 Competências Gerais a serem trabalhadas em toda a Educação Básica, ou seja, na Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. São elas: Conhecimento Pensamento científico, crítico e criativo, Repertório cultural, Comunicação, Cultura digital, Trabalho e Projeto de Vida, Argumentação, Autoconhecimento e autocuidado, Empatia e cooperação e Responsabilidade e cidadania. Aqui vamos nos ater ao item Projeto de Vida, nos debruçando sobre este trabalho no Ensino Médio.

De acordo com Santos e Gontijo (2020, p. 20)

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Ensino Médio de 2018 visa a construção de um currículo baseado na educação integral e com o desenvolvimento pleno do estudante. Entre as dez competências listadas no documento encontra-se o projeto de vida como um dos elementos para construção da formação integral. A BNCC como documento norteador dos currículos escolares busca, por meio dessa competência, reiterar o foco no estudante, no protagonismo discente e no seu projeto de vida.

Essa visão surgiu após muitos anos de uma educação pautada no tradicionalismo que tinha por foco os conteúdos, tornando o ensino algo estático e acrítico. Neste fazer pedagógico “não há criatividade, não há transformação, não há saber” (FREIRE, 2021, p. 81). Com isso, é notório que para a educação realmente trazer uma transformação na vida do sujeito, a escola e o professor devem oferecer formas de estimular as experiências dos alunos, auxiliando na criação de hipóteses pessoais sobre os conhecimentos e principalmente não engessando o conteúdo em uma visão estreita de mundo, exclusivamente escolar e individualista (ELIAS, 2008).

Para que a educação consiga transformar verdadeiramente o sujeito em um ser crítico, capaz de utilizar os saberes adquiridos na instituição escolar em sua vida prática, é necessário que o aluno seja o protagonista de suas aprendizagens. Vickery et al. (2016) afirmam que a aprendizagem ativa, ou seja, aquela que auxilia o aluno a desenvolver suas aprendizagens de pensamento, só acontece quando a sujeito se envolve no planejamento, na execução e na avaliação de suas aprendizagens. Desta forma, o Projeto de Vida vem auxiliar o aluno a “arquitetar, conceber e plasmar o que está por vir” (BRASIL, 2018a). A BNCC define que o Projeto de Vida venha

Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade e autonomia, consciência crítica e responsabilidade. (BNCC, 2018b, p. 05)

Assim, é importante que a escola auxilie o aluno a ter uma experiência a fim de refletir sobre seu Projeto de Vida, de forma individual, criando uma conexão entre passado, presente e futuro (GONÇALVES; BASQUEIRA, 2019). Percebe-se com isso que o Projeto de Vida deve ser construído para que o aluno caminhe entre o “quem eu sou” até o “quem eu quero ser”, por meio de um processo de autoconhecimento, planejamento e prática, identificando “seus potenciais, interesses e sonhos, definindo metas e estratégias para alcançar seus objetivos” (MACHADO, 2020). Com estas considerações, podemos definir que o Projeto de Vida atua para desenvolver competências específicas na formação do cidadão apto a conviver no século XXI de maneira autônoma, produtiva e solidária.

É extremamente relevante que haja uma compreensão do educador quanto ao Projeto de Vida durante o Ensino Médio. Isso pois, durante a adolescência muitos alunos se sentem confusos, desmotivados ou desorientados quanto ao seu presente e futuro. Neste contexto, é papel do professor atuar como um mediador entre o conhecimento, o aluno e suas construções cognitivas e sociais. Assim, é fundamental que a escola fomente o protagonismo juvenil em suas ações pedagógicas, pois este é o marco da educação ativa.

O papel do educador se reforça como um guia que abre portas para diversos cenários de amadurecimento e crescimento juvenil. Ou seja, o sucesso na prática de um projeto de protagonismo juvenil depende de estabelecer um novo tipo de relacionamento entre jovens e adultos, em que o adulto deixa de ser um transmissor de conhecimento para ser colaborador e parceiro do jovem em suas descobertas e nas ações comunitárias. O aluno deve ser visto como fonte de iniciativa, liberdade e compromisso. Por isso, é essencial estimular os jovens a tomarem a frente dos processos e, ao mesmo tempo, vivenciarem possibilidades de escolha e de responsabilidades. (INSTITUTO PURANÃ, 2019)

Para promover esse protagonismo juvenil, colocando o aluno como o protagonista de suas aprendizagens, as metodologias ativas surgiram como uma poderosa ferramenta educacional, sobre a qual percebemos diferentes formas de mediar o aluno a elaborar o seu Projeto de Vida. E neste aspecto, Moran (2017) afirma que podemos nos apoiar em metodologias ativas com apoio de Tecnologias de Informação. Ele também define que

O projeto de vida na escola faz parte da metodologia de projetos, de aprendizagem ativa de valores, competências para que cada estudante encontre relevância, sentido e propósito no seu processo de aprender, e o integre dentro das suas vivências, reflexões, consciência, visão de mundo. É formado por um conjunto de atividades didáticas intencionais que orientam o estudante a se conhecer melhor, descobrir seu potencial e dificuldades e também os caminhos mais promissores para seu desenvolvimento e realização integral. (2017)

O Projeto de Vida versa sobre a necessidade de o estudante compreender a  relevância dos conteúdos estudados durante sua jornada acadêmica, e em seguida, ser capaz de esquematizar objetivos que sejam alcançados de acordo com o desenvolvimento das habilidades adquiridas.

Enfrentar os desafios diários da própria vida pode ser ainda mais difícil quando o jovem não sente que está preparado, e isso não deveria ocorrer pois é papel da escola preparar o indivíduo para a vida em sociedade. Desta maneira, o Projeto de Vida surge para que o aluno possa pensar, planejar e desenvolver, de forma crítica e reflexiva, metas relacionadas ao seu próprio futuro.

O Projeto de vida é um caminho importante para crianças e jovens encontrem – num clima de confiança, acolhimento e colaboração - relevância, sentido e propósito em tudo o que aprendem dentro e fora da Escola, como parte de um movimento amplo de transformação da Escola como um todo (currículo por competências, metodologias ativas, redesenho dos espaços, da avaliação, com forte inserção na cidade e também no mundo digital). (MORAN, 2019)

Assim, para que o aluno possa realmente obter uma formação crítica e integral, que o auxilie a desenvolver autonomia e engajamento na vida social e econômica do país, é preciso que observemos com diligência e cuidado a construção de seu Projeto de Vida.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018a.

BRASIL, Ministério da Educação. BNCC – IMPLEMENTAÇÃO. Projeto de vida: Ser ou existir? 2018b. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/implementacao/praticas/caderno-de- praticas/aprofundamentos/200-projeto-de-vida-ser-ou-existir. Acesso em: 02 ago. 2021.

ELIAS, Marisa del Cioppo. Célestin Freinet: uma pedagogia de atividade e cooperação. 8ª ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

ENTENDA o que é protagonismo juvenil. INSTITUTO PURANÃ. 29 mai. 2019. Disponível em: http://www.institutopuruna.com.br/protagonismo-juvenil/. Acesso em: 02 ago. 2021.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 77ª ed. Rio de Janeiro/ São Paulo: Paz e Terra, 2021. 256 p.

GONÇALVES, Márcia Cristina; BASQUEIRA, Ana Paula. Relações Interpessoais e Administração de Conflitos. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2019. 168 p.

MACHADO, Gilber. Projeto de Vida na Escola: Como desenvolver, o que diz a BNCC, desafios e práticas na educação. BLOG KUAU. 2020. Disponível em: https://blog.kuau.com.br/projeto-de-vida/projeto-de-vida-na-escola/. Acesso em: 02 ago. 2021.

MORAN, José. A importância de construir Projetos de Vida na Educação. 2017. Disponível em: http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2017/10/vida.pdf. Acesso em: 02 ago. 2021.

MORAN, José. Desafios na implementação do Projeto de Vida na Educação Básica e Superior. 24 jun. 2019. Disponível em: https://moran10.blogspot.com/2019/06/desafios-na-implementacao-do-projeto-de.html. Acesso em: 02 ago. 2021.

SANTOS, Kaliana Silva Santos; GONTIJO, Simone Braz Ferreira Gontijo. ENSINO MÉDIO E PROJETO DE VIDA: POSSIBILIDADES E DESAFIOS. Rev. Nova Paideia - Revista Interdisciplinar em Educação e Pesquisa. Brasília/DF, v. 2, n. 1. p. 19 – 34 – ANO 2020.

VICKERY, Anitra et al. Aprendizagem ativa nos anos iniciais do ensino fundamental. Tradução de Henrique de Oliveira Guerra. Porto Alegre: Penso, 2016. 252 p.

terça-feira, 8 de junho de 2021

A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO E SUA IMPORTÂNCIA NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR

 

Fonte: https://www.todoestudo.com.br/historia/escolas-jesuitas (2021)
Por Fernanda Mendes 


A História da Educação consiste em uma disciplina obrigatória nos cursos de pedagogia no Brasil. É interessante pontuar que os saberes envoltos nesta disciplina devem ser construídos de forma reflexiva e crítica, pois sabemos que a atual sociedade é um espelho do que foi vivenciado durante séculos de construção social.

A educação está presente em todas as sociedades e passa por diversas mudanças ao longo do tempo. A sociedade, de uma forma ou de outra, se educa – e a educação molda o homem e, a depender da finalidade dela na sociedade, pode ser utilizada como forma de dominação ou de libertação. (SOUZA, 2018)

No ano de 1549 os jesuítas chegaram ao Brasil na intenção de catequisar os índios e educar os nobres que aqui habitavam. Oficialmente, este é o início do ensino, conforme conhecemos, no nosso país. É bem verdade que antes disso a educação já se fazia entre os nativos, que passavam de geração a geração os conhecimentos sobre a caça, a pesca, o artesanato, a colheita, as lendas e tradições, o uso medicinal das ervas e muitos outros saberes. Mas o ensino sistematizado surgiu a partir da chegada da Companhia de Jesus, objetivando a expansão dos fiéis da Igreja Católica, que tanto temia a expansão do protestantismo no mundo.

Este tipo de educação não vinha com nenhuma intenção transformadora ou para formar indivíduos pensantes. Sua maior intenção era fortalecer os laços da população brasileira com a igreja, e assim garantir que em terras tupiniquins o movimento protestante não se criasse. A educação jesuíta se estendeu soberana no Brasil até o ano de 1759. Neste ano, o então Marquês de Pombal, visando diminuir o poder da Igreja Católica sobre o reino de Portugal, determinou a expulsão dos jesuítas do Brasil, dando início ao que conhecemos como Reforma Pombalina. Existem muitos pormenores nesta decisão e, estudando mais a fundo, compreendemos que a intenção era promover uma educação mais laica e estadista. No entanto, neste momento específico a educação não se fazia mais com um único professor, cada disciplina tinha seu próprio mestre, no que ficou conhecido como aulas régias. Os educadores eram então pessoas despreparadas para exercer a função de professor, o que levava a uma péssima qualidade educacional. Outro ponto que é importante destacar é a intensa fragmentação dos saberes, fator este que foi marcante até o século XX, sendo marca do ensino tradicional humanista.

Após a chegada da família real no Brasil tivemos muitos progressos, com grandes construções de escolas, teatros, museus, bibliotecas e um ensino um pouco mais organizado. Em 1823 o chamado Método Lancaster foi amplamente utilizado na educação brasileira. Esta metodologia consistia em um aluno (decurião) mais experiente auxiliar até dez alunos (decúria), o que ocasionava uma diminuição na quantidade de professores especializados.

Prosseguindo, durante a Primeira República no Brasil, o clima de desorganização se potencializou com as reformas educacionais que insurgiam em todos os lugares. Entre elas, podemos citar a Reforma Benjamin Constant, a Lei Orgânica Rivadávia Corrêa e a Carlos Maximiliano. A Reforma Rivadávia foi desastrosa na educação brasileira, pois desoficializou o ensino e desta forma qualquer instituição poderia emitir um diploma, sem nenhuma verificação de qualidade. Desta forma, já no século XX surgiu um movimento mundial que urgia por uma educação mais integral, que se interessasse pelo aluno e por suas peculiaridades: a Escola Nova. Como já mencionamos, este movimento surgiu após anos de educação tradicionalista, pautada no professor como figura detentora do saber e aluno como tábula rasa, preparando-o para reproduzir conceitos e saberes. Na Escola Nova o aluno era visto como um ser único, individual. A cerca disso, a médica e educadora italiana Maria Montessori dizia que as crianças eram vistas como mini adultos, por isso não se pensava em seus gostos ou necessidades específicas.

Quando a criança sentava-se nos móveis dos adultos, ou no chão, era repreendida; tornava-se necessário que alguém a pegasse no colo para que pudesse sentar. Eis a situação de uma criança que vive no ambiente dos adultos: um importuno, que procura algo para si e não encontra, que entra e logo é repudiado. (MONTESSORI, 1988, p. 8)

Com estas discussões que ocorriam ao redor do globo, muitos novos conceitos surgiram no âmbito educacional. Aqui no Brasil, entretanto, tivemos muitas lutas nos anos que se seguiram, pois poucos anos após o fim da Era Vargas, entramos em uma fase de Ditadura Militar, na qual a educação sofreu duras represarias com relação a livre expressão do ensinar. A metodologia mais usada era a tecnicista, objetivando cidadãos preparados para o mercado de trabalho, porém sem voz ativa para lutar por seus direitos dentro da sociedade. Centenas de pessoas foram caladas por meio da tortura ou exílio, e dentre estas podemos destacar Paulo Freire, que tanto lutava para uma educação libertadora em nosso país.

No ano de 1988, após a homologação da Constituição Federal e com o fim da Ditadura Militar, a educação passou a ser um assunto mais sério e respeitado no país. No artigo 205, lemos que:

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (grifo nosso)

Desta forma, percebemos que compreender este percurso que a educação trilhou no Brasil é extremamente importante para que o professor compreenda o caráter libertador que a educação pode oferecer. Portanto, este conhecimento proporciona ao professor a oportunidade de um fazer pedagógico crítico que impulsionará a formação integral de seus alunos em busca de um futuro mais justo e promissor.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

MONTESSORI, Maria. A criança. 3ª ed. São Paulo: Círculo do Livro, 1988. 243p.

SOUZA, José Clécio Silva e. Educação e História da Educação no Brasil. Educação Pública. 27 nov. 2018. Disponível em: &lt;https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/18/23/educao-e-histria-da-educao-no-brasil&gt;. Acesso em: 07 jun. 2021.

quarta-feira, 19 de maio de 2021

GAMIFICAÇÃO NA EDUCAÇÃO: Interações e Brincadeiras


Por Fernanda Mendes

INTRODUÇÃO

Quando tratamos de Educação Infantil devemos entender que nesta fase de desenvolvimento a ludicidade é o fator mais importante para alcançarmos um ensino de qualidade. As crianças conseguem absorver melhor os conteúdos quando nos utilizamos da linguagem adequada, envolvendo a maneira como elas vêem o meio que as cerca. Por este motivo, mediante as interações e brincadeiras, o educador será o mediador entre a criança e o desenvolvimento de suas potencialidades, construindo assim aprendizagens significativas.

Neste sentido, surge o termo “gamificação” que vem sendo utilizado no meio educacional para designar atividades dispostas com dinâmicas de jogo, trazendo engajamento do aluno em seu processo de aprendizagem. E sobre este tema iremos discorrer, atentando para os métodos, os desafios e os ganhos obtidos através do uso da aula gamificada.

INTERAÇÕES E BRINCADEIRAS

Um documento muito importante, fruto de muitas discussões e que atualmente serve como norteador dos currículos escolares da educação básica no Brasil é a BNCC – Base Nacional Comum Curricular. Ela serve como um direcionador curricular e veio assegurar que os alunos terão uma formação básica comum, com conteúdos mínimos e parte diversificada em qualquer região do país.

No âmbito da Educação Infantil, a BNCC projeta uma didática baseada no Educar e Cuidar, ações indissociáveis às crianças desta fase. Assim sendo, no concernente à Educação Infantil, a BNCC está ajustada às leis brasileiras como dispostas na resolução nº 5 de 17 de dezembro de 2009 que afirma que a práxis pedagógica deve ter as interações e as brincadeiras como eixos norteadores.

Se torna evidente que este eixo é responsável por atuar no desenvolvimento cognitivo e motor das crianças. É através da ludicidade que os alunos conseguem assimilar os conteúdos propostos, portanto o professor deve ter esta prática como aliada em seu fazer pedagógico. A base nos apresenta seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento que são fundamentais na Educação Infantil, e são eles conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se. Além disto, ela propõe que, o que antes era visto como disciplinas, agora seja transformado em Campos de Experiência, que abrangerão temas que se conectem aos direitos de aprendizagem que ela dispõe.

Os campos de experiência constituem um arranjo curricular que acolhe as situações e as experiências concretas da vida cotidiana das crianças e seus saberes, entrelaçando-os aos conhecimentos que fazem parte de patrimônio cultural. (BRASIL, 2018)

Portanto, quando o professor alia suas aulas às atividades que envolvem as interações entre a criança e seus pares e entre a criança e o educador ele está proporcionando um conhecimento que será enraizado nos alunos, e embasado no eixo de interações e brincadeiras proposto pela BNCC.

Quando nos referimos às brincadeiras na Educação Infantil é importante salientar que o brincar deve ser levado a sério, e não somente como um passatempo em que as crianças estarão envolvidas. O brincar deve ser algo que tenha uma intencionalidade pedagógica, sendo responsável por atingir um objetivo previamente proposto.

A PROPOSTA DE GAMIFICAÇÃO

Vem surgindo no meio educacional uma nova metodologia ativa, chamada de gamificação. Esta pretende introduzir nas aulas atividades com design e linguagem de jogos, envoltas em conteúdos necessários à aprendizagem das crianças. A estratégia pode englobar o uso de tecnologias digitais, tais como tablets, computadores e celulares, mas também pode ser aplicada de maneiras diversas, como jogos de tabuleiro, jogos em equipe, e outras possibilidades.

O termo gamificação compreende a aplicação de elementos de jogos em atividades de não jogos. Assim, embora a palavra tenha sido utilizada pela primeira vez em 2010, a gamificação tem sido aplicada há muito tempo. Na educação, por exemplo, a criança podia ter seu trabalho reconhecido com estrelinhas (recompensa) ou as palavras iam se tornando cada vez mais difíceis de serem soletradas no ditado da professora (níveis adaptados às habilidades dos usuários). (FADEL et al., 2014)

A sugestão ao gamificar uma aula é proporcionar a diversão própria dos jogos envolta em um aprendizado, que será muito mais facilmente assimilado pelos alunos do que seria por métodos tradicionais. Isso se deve ao fato das crianças se sentirem mais atraídas em vencer, passar de fase, cumprir determinada missão, e isso só será possível depois que elas cumprirem as propostas pedagógicas que estarão inseridas no jogo. Com certeza, essas metodologias contribuem no desenvolvimento das habilidades dos alunos, ampliando suas potencialidades.

Todavia, quando usamos de práticas de gamificação em sala de aula, não podemos nos esquecer na importância do uso de regras claras e objetivos previamente estabelecidos, pois somente assim será considerada uma prática pedagógica. É preciso também incentivar as crianças a se engajar na proposta, e para isso podemos usar o método de recompensa, preocupando-se sempre em observar também se as atividades condizem com a fase de desenvolvimento em que as crianças se encontram.

A gamificação vem como uma proposta educativa que leva o aluno a se tornar o autor de seu processo de aprendizagem, em outras palavras, a criança se torna protagonista na construção dos seus conhecimentos. Neste contexto o professor será um mediador entre o aluno e o conhecimento, um incentivador entre a interação dos saberes historicamente construídos e os discentes. A troca de vivências neste momento é extremamente significativa, fazendo com que essa metodologia se torne rica e produza resultados que serão bastantes positivos ao desenvolvimento dos alunos.

PASSANDO DA TEORIA À PRÁTICA

Entendendo o conceito de gamificação na educação, agora se faz necessário conhecer os métodos e as aplicações práticas desta metodologia em sala. Existem diversos modos que podemos nos apoiar para a gamificação das aulas, pois com criatividade, todos os dias surgem novidades na área.

Entretanto, são necessários alguns cuidados antes de escolher uma atividade gamificada para aplicarmos em sala de aula. Em primeiro lugar é necessário que o pedagogo entenda bem o conceito de gamificação, tendo em vista principalmente seu objetivo com este método. Seguidamente, é importante considerar as fases de desenvolvimento, como proposto por Piaget.

De acordo com Piaget, o desenvolvimento da cognição durante a infância passa por quatro estágios, do nascimento à pré-adolescência. Somente após o último estágio é que se pode dizer que o indivíduo atingiu sua capacidade de raciocínio plenamente. (FERRONATO, 2016.)

É crucial que o educador que proponha aulas gamificadas saiba utilizar da maneira adequada a linguagem dos games, e que tenha os objetivos bem claros para que as crianças entendam quais são as regras a serem seguidas, respeitando sempre as fases de desenvolvimento infantil.

Evidentemente, as crianças estão inseridas em mídias digitais cada vez mais cedo. É comum vermos os pequeninos com celulares ou tablets nas mãos, usando aplicativos de jogos ou em sites como YouTube assistindo clipes musicais, próprios pra sua idade. Por este motivo, buscando aliar a educação às novas tendências mundiais da sociedade, é que a gamificação é um método que deve ser usado na Educação Infantil.

Através das mídias digitais podemos usar os jogos educativos próprios para cada fase de desenvolvimento, utilizando sons, imagens, lógica, lateralidade, entre tantos outros pontos que podem servir de ferramenta educacional.

Por meio dos jogos em equipe, podemos também utilizar da gamificação, propondo disputas, maratonas e outras atividades que despertem o desejo de ganhar, de cumprir as missões, para assim atingir os objetivos propostos.

O ato de jogar influencia diversos outros aspectos positivos além da aprendizagem, tais como: cognitivos, culturais, sociais e afetivos. Por meio do jogo, é possível aprender a negociar em um ambiente de regras e adiar o prazer imediato. É possível trabalhar em equipe e ser colaborativo, tomar decisões pela melhor opção disponível. Todas essas características são suportadas pelos jogos. (FERNANDES; RIBEIRO, 2018.)

O uso de palavras como fase, nível e avatar podem ser usados na aula para designar ações dentro de um ambiente de jogo. Um bimestre ou um período de tempo estipulado pelo professor para lecionar um conteúdo pode perfeitamente se transformar em fase. Um aluno pode escolher ser um personagem, se tornando assim um avatar. Assim, quando uma criança termina de cumprir o nível ou fase proposto pelo educador ela pode subir de nível, recebendo então uma recompensa, que poderia ser desde um brinde simbólico até algo como um botton, uma medalha, uma coroa feita com materiais de papelaria, enfim, conforme a criatividade permitir. Tudo isso fará com que a criança desenvolva melhor suas habilidades e a levará a atingir melhor seus níveis cognitivos.

A GAMIFICAÇÃO NÃO PODE SER UMA DISTRAÇÃO

Ainda existem professores que vêem as aulas gamificadas como uma didática que pode influenciar para a alienação dos alunos, fazendo com que eles se distraiam durante o ensino. Porém é importante que o educador entenda o papel da ludicidade aplicada aos processos de ensino-aprendizagem, principalmente na Educação Infantil. Assim sendo, gamificar na educação é possível quando aliamos o uso da didática a intencionalidades pré-determinadas, com conteúdos adequados.

O ato de gamificar é conduzir a criança a descobrir suas potencialidades, respeitar a dinâmica das tarefas, ser criativa, assim como trabalhar em grupo.

Ao usarmos metodologias que envolvam os alunos, é bem provável que eles se sintam motivados a participar mais ativamente, construindo dia após dia seus conhecimentos, sendo assim, esta prática pedagógica é uma aliada para o combate ao desinteresse nos estudos, que podem acabar até mesmo em evasão escolar.

A GAMIFICAÇÃO E A ESCOLA

As relações entre a escola e os alunos devem ser pautadas sempre por diálogos. E nada mais justo que falar a mesma língua, ou seja, abordar os assuntos de maneira clara para que os alunos se sintam à vontade no ambiente escolar. Para que possamos fazer então esta junção entre o universo do aluno e a instituição de ensino, a ludicidade é uma ferramenta útil e necessária.

Assim, percebemos que a gamificação vem como uma prática que promove essa comunicação de maneira descomplicada, de fácil aceitação. Entretanto, mais uma vez convém afirmar a importância da intencionalidade educativa, quando promovermos aulas gamificadas.

Como se trata de um fenômeno novo, os professores devem ter cautela. Antes de tentar aplicar a gamificação no contexto escolar, é preciso que os professores tenham domínio da linguagem e dos elementos que constituem os games. Aplicar uma nova metodologia sem o respectivo conhecimento e adequação podem não trazer os resultados esperados. (ARRUDA; BIANCHINI; GOMES, 2015)

Isto posto, podemos dizer que conhecer o universo gamer, suas expressões e as vastas opções se faz indispensável para fazer uso da metodologia ativa da gamificação. Existem muitos aplicativos que podemos utilizar em sala de aula, voltados à gamificação para a educação. Na Educação Infantil, podemos destacar o Silabando, A, B, C do Bita e YouTube Kids como exemplos. Ainda podemos promover jogos em classe, dividindo os alunos em equipes que deverão desenvolver as tarefas propostas pelo educador, lembrando sempre da importância de incentivar os alunos através de premiações, simbolizando assim, de forma concreta, o ato de vencer, que com certeza também indica a aquisição dos conhecimentos apontados.

CONCLUSÃO

Podemos inferir assim que como o mundo está se tornando cada vez mais competitivo e seduzido por mídias digitais, fazer o uso da gamificação em sala de aula pode se tornar bem proveitoso. Ao coordenar as aulas de maneira lúdica, incentivando o engajamento dos alunos por meio de jogos e brincadeiras, o professor está fazendo com que suas práticas estejam de acordo com o que está disposto na BNCC, e assim sendo, estará trabalhando em prol do melhor desenvolvimento possível de seus alunos.

É inegável que a ludicidade é uma ferramenta eficaz na Educação Infantil, e ficou claro que o educar e o cuidar são indissociáveis nesta fase. Devemos também reafirmar a relevância que o educador deve dar as fases de desenvolvimento infantil, pois somente assim a educação será completa.


REFERÊNCIAS

ARRUDA, Renata Beloni de; BIANCHINI, Luciane Guimarães Batistella; GOMES, Ligiane Raimundo. Ludicidade e Educação. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A, 2015.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Educação é a Base. Brasília, MEC/CONSED/UNDIME, 2018.

FADEL, Luciane Maria e col. Gamificação na Educação. São Paulo: Pimenta Cultural, 2014.

FERNANDES, Carlos Wilson Ribeiro; RIBEIRO, Erick Luiz Pereira. Games, gamificacao e o cenário educacional brasileiro. Congresso Internacional de Educação e Tecnologias, Encontro de Pesquisadores em Educação à Distância, 2018, Anais.

FERRONATO, Raquel Franco; FREITAS, Márcia de Fátima Rabello Lovisi; PINTO, Rosângela de Oliveira. Psicologia da educação e da aprendizagem. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A. 2016.


sábado, 20 de junho de 2020

O CURRÍCULO (1918) JOHN F. BOBBIT


Resenha por Fernanda Mendes

 

    No início do século XX nos Estados Unidos da América havia uma consolidação da economia industrial e uma crescente estruturação do sistema capitalista. Neste contexto, é imperativo que exista a construção de novas escolas, como também uma nova concepção do sistema educativo que atenda os anseios populares e que consiga resolver os problemas resultantes da educação daquele momento, isto é, preparar corretamente os indivíduos para seus futuros papéis na sociedade industrial.

    Neste cenário, onde a era da ciência exige exatidão e especificidade, a educação era vista por muitos como a cura social para crianças delinquentes, crianças pobres, imigrantes e raças minoritárias como indígenas e negros (resultante de uma ideologia de estratificação social). Muitos teóricos, filósofos e sociólogos da época fizeram suas contribuições sobre a temática, dentre eles Armstrong que acreditava ser “a formação manual uma forma de corrigir os defeitos de caráter dos afro-americanos”. Percebemos que a intenção da educação era controlar socialmente os indivíduos. Conforme vamos avançando na leitura, vamos percebendo isso de maneira mais clara.

    John Franklin Bobbit, nascido em 16 de fevereiro de 1876 no estado de Indiana, nos EUA, dedicou sua carreira ao campo do currículo. Representa a corrente de pensadores que preza pela eficiência, sendo esta palavra aliada a objetivos os termos mais importantes de suas obras. Para ele, as pessoas só deveriam aprender aquilo que fosse realmente útil na vida prática, o que resultou em um currículo prático, objetivo, baseado na solução dos erros, que são visto como desperdício, o fruto de uma visão limitada. Então, nesta perspectiva, a escola não tem como papel a transformação da sociedade, mas sim funcionar como agência de controle social, estruturando-se na base de critérios de eficiência (taylorismo).

               

“A educação para a eficiência não é propriamente um sentimento, mas um negócio, não é caridade, mas sim uma orientação.”

 

    Bobbit percebia a escola como uma fábrica, onde se produziria o adulto desejado, com a personalidade moldada e trabalhada. Percebemos que assim sendo, a ideologia da eficiência social é cheia de padrões de segregação, pois visava colocar cada um em seu lugar pré-determinado, como se cada classe ou conjunto de pessoas tivesse nascido para determinado papel. Para o eficientismo, de acordo com as palavras de Levine: “temos de parar de ensinar a criança mediana, o gênio e o lerdo, eles não podem aprender ao mesmo tempo. Há que se formular um currículo para estes tipos de criança”. Atualmente, vemos que a multiculturalidade, a junção dos diferentes, o convívio com as mais diversas pessoas oportuniza um conhecimento rico, um aprendizado mais integrador e humanizado. Também defensor do currículo eficiente, Kliebard afirma dever existir um currículo diferenciado para as classes sociais diferentes.

               


 

      

    Dewey, filósofo e pedagogo respeitado por suas contribuições à educação, mostrou-se resistente a vocacionalização do currículo que em suas palavras “estava a minimizar a função mais importante da educação, a promoção do crescimento intelectual e moral”. Dewey ainda afirmou “um currículo virado apenas para a eficiência técnica faz da educação um instrumento perpétuo de manutenção da ordem social existente, em vez de operar como veículo de transformação”.



                

    Outra observação importante a se fazer é a referência do autor ao modo em que a mente sempre está ávida a conhecer, por curiosidade própria, sem no entanto preocupar-se na utilidade prática daquele conhecimento, daí a importância em selecionar os conteúdos de forma prática e útil.

    A maneira de aprender deve partir do conhecer, manipular, observar e depois ler a reconstrução das experiências de outros. Bobbit destaca veementemente a importância das aulas práticas através das atividades domésticas, destacando-se entre elas: a construção em geral, a costura e a gastronomia.

    A respeito dos objetivos da educação profissional, Bobbit salienta que quando os professores envolvem-se em levar o aluno a atingir o máximo de suas capacidades, desencorajando-o às ditas “profissões inferiores” (comerciantes, mineradores, agricultores, operários e etc.) resulta em uma frustração da maior parte destes alunos. Isto pois quando adultos e estiverem se inserindo no mercado de trabalho perceberão que não há espaço para todos, e acabarão se inserindo nestas profissões porém de forma despreparada. O ensino desta forma culmina na evasão de jovens ao perceberem a falácia educacional (ainda que bem intencionada) ao que o autor chamou de “bom senso”.

   Para uma eficiente educação é necessário a transmissão dos conhecimentos dos membros mais velhos aos mais jovens, ao que neste olhar a escola deve atuar como primeira agência do progresso social, fazendo com que a geração mais nova cumpra com suas funções no mercado de trabalho de forma mais eficiente que seus pais.

 

“A educação é o caminho para o progresso social. Como agências de progresso social, as escolas deviam prestar um serviço eficiente e um serviço orientado, não por suposição, capricho ou especial interesse próprio, mas pela ciência.”

 

    A ciência deve dominar a consciência do trabalhador, que deve pensar em cada fator nos termos da ciência. Assim sendo, essa eficiência se traduzirá em números, por exemplo: se antes um pedreiro era capaz de assentar 150 tijolos em uma hora, com a formação técnica especializada ele será capaz de assentar 350 tijolos no mesmo espaço de tempo. Aqui é evidenciado a valorização da destreza manual em determinadas profissões aliada ao discernimento intelectual. Sem a formação técnica necessária, em frente a um problema relativo ao trabalho o sujeito terá três possíveis reações:


  • Aplicar procedimentos empíricos, ou seja, aqueles que ele conhece por praticar ou de ouvir praticar;

  • Imaginar uma possível solução;

  • Não saber o que fazer.

    O indivíduo formado tecnicamente se sente preparado frente às diversas situações, não tendo que adivinhar as soluções, pois sua base será científica. Por esse e ainda outros motivos, a educação deve servir como uma preparação para a vida inteira. O indivíduo formado tecnicamente é capaz de assimilar facilmente novos conhecimentos de sua área específica, acompanhando assim as inovações científicas necessárias para a eficiência do seu trabalho. Aquele porém que não possui essa formação jamais conseguirá acompanhar as inovações necessárias ao seu trabalho, pois não possui os conhecimentos prévios necessários.

    Fazendo uma analogia à divisão do trabalho e suas alienações, Bobbit relaciona o trabalho do professor em sala de aula como o de um funcionário que não acompanha todo a produção de um determinado produto. Pensando assim, fazendo um paralelo em que o professor é o operário e o aluno o produto trabalhado, ele menciona que o educador deve ser especializado em uma área, porém deve ser generalista em todas as outras, ou seja, ter conhecimento básico sobre todo o ensino que o educando receberá, pois isso influenciaria no produto final: o adulto desejado.

               

TAYLORISMO

 

    Nesta altura do livro o autor aborda um pouco sobre o Sistema Taylor, fazendo certa referência a este na educação. No taylorismo não se espera que os trabalhadores façam qualquer reflexão ou julgamento ou ainda que tomem qualquer decisão, pois tudo é feito para eles, que simplesmente obedecem a ordens. Para Bobbit, o taylorismo era meio caminho andado para uma gestão eficiente, o que faltava era dar aos trabalhadores o conhecimento necessário para saber executar as ordens recebidas.



 

    As atividades escolares para a formação vocacional devem dar aos indivíduos uma noção da realidade, quanto à natureza do trabalho e dos materiais utilizados no trabalho, sendo assim a escola é um local de treinamento. Vemos neste contexto uma exaltação à necessidade de uma escola que ensina na prática a manipulação de matérias primas, como madeira, metal, ferramentas, tecidos e etc, ao que Bobbit chama de alfabeto da experiência. Além da experiências com estes objetos, os alunos deveriam conhecer o comércio (compra e venda), manipulação do dinheiro, poupança e seguros, contabilidade e afins.

 

O BOM CIDADÃO

    Desde as sociedades primitivas e mais antigas de que se tem notícia, as pessoas tendem a ter comportamentos baseados em duas virtudes: as intragrupo e as extragrupo. Essas virtudes seriam baseadas no sentimento de pertencimento a um determinado grupo, tendo em vista a subsistência do mais forte. Explicando melhor, uma pessoa de uma determinada tribo ou grupo deverá proteger os seus e repelir os “estrangeiros” de maneira enérgica. O bom cidadão então é visto como aquele que possui ambas virtudes básicas:


  • INTRAGRUPO à Dentro de um grupo; que se efetua, tem lugar ou está inserido dentro de um grupo social, instituição ou comunidade.

 

ü  Ajudar o outro;

ü  Ser justo;

ü  Ser cortez;

ü  Ser modesto;

ü  Ser humilde.


  • EXTRAGRUPO à Fora de um grupo, que é estranho aquela sociedade e não está inserido naquela comunidade.

 

ü  Destruição;

ü  Arrogância;

ü  Crueldade;

ü  Mentira.

 

    Aquele que é bondoso com o inimigo comete o crime de traição, e deverá ser julgado com o mesmo rigor daquele que é mal com os de seu grupo. Isso significa então que a natureza virtuosa ou repugnante de um ato em si não está no próprio ato, está no contexto social acerca deste. As virtudes e os vícios são vistos como coisas relativas e não absolutas. Matar uma criança de uma comunidade inimiga não tem o mesmo peso que matar uma criança da própria comunidade. Neste contexto, Bobbit diz que é mais comum uma pessoa possuir as virtudes extragrupo em um patriotismo exacerbado que praticar as virtudes intragrupo.

    Essa virtude dupla, imposta pela divisão social, leva à escola a necessidade de conceber um currículo que produza uma grande consciência de grupo, gerando nos jovens o sentimento de pertencimento. Essa consciência fará com que o sujeito pense, sinta e aja com o grupo, como parte dele.

    O bom cidadão deve olhar pelo bem coletivo, ou seja, pelo bem municipal em geral. As escolas então devem incentivar o conhecimento de temas práticos relativos à vida em comunidade, como: pavimentação asfáltica, eletricidade, impostos, saneamento básico, campanha contra mosquitos e outros. As pessoas ligadas à educação deveriam liderar a orientação e a realização das funções e tarefas cívicas. Numa democracia representativa a principal função das pessoas, enquanto cidadãos é a realização da sua função de inspeção.

    Sobre a educação física e os cuidados com o corpo, o autor relata que formar para um nível elevado de vitalidade física é um dos aspectos fundamentais da formação para a eficiência vocacional. A formação física perfeita é aquela que atinge 100% de nível de vitalidade e consegue manter este nível. Assim sendo, deverá conter não somente exercícios musculares como instruções sobre um período de sono suficiente, hábitos alimentares corretos, proteção contra os microorganismos, e etc.

    Bobbit afirma ainda ao longo da obra a necessidade imprescindível de cultivar o hábito de ler. Obviamente, ler aquilo que apresente uma revelação adequada dos dramas humanos, ou seja, ler para ter algo que o ajude a ver a vida de maneira totalizante. Essas leituras seriam sobre viagens, história, geografia, leituras sobre comércio, higiene e etc. Ele salienta a importância do livro didático auxiliar a educação empírica, experimental.

    A literatura para ele deveria servir bem mais do que apenas a apreciação da literatura em si. O propósito fundamental deveria ser a compreensão e apreciação da espécie humana, questões da humanidade e a contextualização geral do grande drama humano. Sua obra afirma ser necessário o sujeito conhecer diferentes tipos de literatura, porém não se faz necessário compreender seus gêneros literários. A leitura deverá ser de fácil compreensão e em grandes quantidades.

    Em suma, esta obra que é tida como a primeira a respeito da necessidade da elaboração de um currículo comum, nos dias de hoje pode ser vista como arcaica em muitos sentidos. Porém, não é minha intenção tecer críticas ao livro e sim um resumo para facilitar o acesso ao conhecimento da obra. Muitos outros fatores poderiam ser comentados aqui, afinal é uma obra extensa com mais de 260 páginas, porém, acredito que com esta resenha possa ter exposto sobre grande parte das ideias de Bobbit. Uma das frases que gostei de ler no livro encerra esta experiência em escrever sobre seu conteúdo de maneira positiva:

 

“A experiência supera a memorização de fatos.”